A Átomo Capital Partners atua no setor da energia renovável e da sustentabilidade e ambiciona contribuir para a descarbonização da economia. Miguel Subtil, Managing Director, faz o balanço de três anos de atividade e explica as metas que quer alcançar.
“A sustentabilidade tem de estar no centro de decisão das empresas já que é imprescindível para a definição do retorno do investimento ou para a sustentação de resultados operacionais”, defende Miguel Subtil, Managing Director da Átomo Capital Partners, empresa que diversifica a sua atividade por áreas como utility scale, electric mobility, energy as a service e real estate sustainability.
Considera que o mercado empresarial português, na maior parte dos casos, ainda não está preparado para as novas realidades relacionadas com a energia e a sustentabilidade, em parte, devido “às falhas de mercado, nomeadamente o foco no curto prazo e falta de incorporação do risco de longo prazo nas tomadas de decisão”. Contudo, Miguel Subtil lembra que “as alterações climáticas são o desafio comum que todos, em conjunto, temos para enfrentar”.
Três anos de atividade, taxa de crescimento anual na ordem dos 30%… A Átomo Capital Partners está a ter a performance que desejava?
O DNA ambicioso e desinstalado da empresa nunca permite que estejamos satisfeitos, nem mesmo quando se superam largamente os objetivos. Tem corrido muito bem e o posicionamento da empresa tem-se revelado como o adequado ao momento de transição climática que vivemos. A incerteza gera sempre oportunidades, mas o importante é deter o conhecimento necessário para as conseguir aproveitar e fazer com que os nossos clientes e parceiros ganhem com isso.
Estamos em tempo de transição e muitos paradigmas estão a mudar, o que gera riscos que muitos não consideram e outros não esperavam ter de incorporar. Parece-nos, neste contexto, que o imobilismo é bem mais arriscado do que estruturar de forma adequada esta mudança. A transição energética e climática tem custos, claro, mas que estão associados a enormes oportunidades. Nesse sentido, queremos sempre mais e procuraremos aproveitá-las bem.
Porquê o setor da energia e sustentabilidade como target dos vossos investimentos?
As empresas têm de ter um propósito, um desígnio. Acreditamos que não tem de haver um trade-off entre ter um impacto positivo na sociedade e retorno financeiro. Antes pelo contrário, neste contexto em que vivemos, os retornos serão maiores em empresas com um propósito. O maior desafio que temos enquanto comunidade global é perceber como conseguiremos continuar a melhorar as nossas condições de vida, num planeta com recursos finitos, uma população global em crescimento acelerado e em emergência climática.
Estava encontrado o nosso propósito, a nossa missão enquanto agentes de mudança neste contexto de emergência, aliando propósito a retorno financeiro e desenvolvimento sustentável.
Qual o vosso investimento/projeto mais representativo desde que iniciaram atividade?
Os grandes projetos de produção de energia renovável de grande escala (Utility Scale), que desenvolvemos para investidores e produtores independentes de energia (IPP) são os mais representativos, até pela sua dimensão.
E quais são, atualmente, as áreas de intervenção com mais peso no vosso volume de negócio? Utility scale, electric mobility, energy as a service ou real estate sustainability….?
Essas são as quatro unidades de negócio que temos atualmente e em que apostamos com igual convicção. No entanto, a área de Utility Scale continua a ser, por enquanto, a que tem maior peso no nosso volume de negócios. Desde logo, porque foi a que iniciámos primeiro, antes dos primeiros leilões solares de 2019 e que teve nos anos subsequentes um enorme desenvolvimento.
Atuamos como developers destes grandes projetos (solares, eólicos, híbridos, hidrogénio…), integrando todos os serviços necessários até à fase ready to build (RtB), lidando e negociando com todas as entidades necessárias e obtendo todas as licenças.
Por outro lado, este mercado está atualmente numa fase em que as oportunidades de acesso à rede elétrica são mais escassas, potenciando operações de M&A. Temos também sido muito procurados para apoiar nestes processos, nomeadamente com a realização de Due Diligences Técnicas, Ambientais e de Licenciamento.
Qual o perfil tipo dos vossos clientes?
Depende bastante da unidade de negócio. Se, no caso de grandes projetos são investidores ou produtores de energia de maior dimensão, no caso da unidade de Energy as a Service estamos a falar de soluções de autoconsumo individual ou coletivo e comunidades de energia, tendo por clientes consumidores como empresas industriais, hotéis, centros comerciais ou detentores destes ativos imobiliários como fundos de investimento, por exemplo.
Já no que se refere à área de Real Estate, os nossos clientes serão os investidores e/ou inquilinos utilizadores dos imóveis. De qualquer forma, trabalhamos sempre no segmento B2B e não nos dirigimos ao cliente particular.
“Acreditamos que o investimento sustentável fará mesmo a diferença (…)”
Com o setor do imobiliário a passar por uma fase de turbulência, qual o impacto que esta área tem no vosso negócio?
Acreditamos que essa ou outra turbulência não irão afetar o caminho de sustentabilidade no imobiliário, por diversas razões. Acreditamos que o investimento sustentável fará mesmo a diferença e que a integração das questões ESG nas estratégias de investimento será a única forma de produzir o impacto pretendido para a transição climática, sem perder o foco no retorno financeiro. É claro que há desafios e falhas de mercado – foco no curto prazo, externalidades negativas não contabilizadas, ou a não contabilização de riscos climáticos futuros. Mas o setor financeiro está a mudar e depressa.
No setor imobiliário, os nossos clientes são os promotores dos projetos que os pretendem atrativos para os investidores, os gestores de ativos que têm a obrigação de manter o valor desses ativos e a sua atratividade no mercado, e também os inquilinos. O Regulamento de Divulgação de Informações Financeiras Sustentáveis (SFDR) em vigor, começa já a ter efeitos, sendo de salientar que este dever de reportar o grau de sustentabilidade da sua atividade não é exclusivo para as entidades financeiras. Também as empresas não financeiras têm obrigações de reporte, que se tornou recentemente mais exigente com a entrada em vigor, em 2023, da Corporate Sustainability Reporting Directive (CSRD), implicando que os inquilinos sejam também mais exigentes com os espaços que ocupam.
Na nossa abordagem, recorremos aos referenciais propostos no âmbito das Certificações LEED, BREEAM e WELL como ponto de partida, não apenas para a obtenção de um ‘selo’ cada vez mais procurado, mas para um alinhamento dos ativos com as atuais exigências ESG e a sua melhoria contínua. No âmbito deste apoio, poderão ainda ser utilizadas outras ferramentas de benchmark, por exemplo, como o GRESB ou ainda a contabilização da pegada de carbono do edificado, na fase de exploração ou até mesmo durante toda a fase de desenvolvimento e construção. Na verdade, esta mudança não se faz porque está a ser exigida, mas porque quem não a fizer correrá riscos graves, nomeadamente de obsolescência, desvalorização e falta de liquidez dos seus ativos.
A Átomo Capital Partners apostou também em áreas como a mobilidade elétrica e as novas tecnologias. Que planos tem para esses setores de atividade no médio prazo?
Na área de mobilidade elétrica estamos a lançar a operação. Somos operadores de Posto de Carregamento (OPC) e estamos numa fase em que assistimos a um fenómeno acelerado de adoção de veículos elétricos por parte da população. As estimativas variam, mas prevê-se que em média, em Portugal, cerca de 30-40% dos novos veículos registados em 2030 sejam elétricos. Isto é uma enorme revolução! Mudámos completamente a forma como utilizamos os nossos veículos e como os dotamos de energia para circular, mudámos os nossos hábitos e temos de adaptar a infraestrutura para fazer face a esta nova realidade. Muitos postos de carregamento terão de ser instalados para fazer face a este crescimento de veículos elétricos e o carregamento público terá um papel fundamental, já que com a massificação prevista nem todos terão a possibilidade de carregar o veículo elétrico em casa ou no escritório.
Estamos, neste momento, a negociar com investidores para escalarmos rapidamente o negócio e, por outro lado, com proprietários, investidores imobiliários, promotores e entidades públicas, no sentido de obtermos um pipeline de localizações que potencie o crescimento que projetamos.
Estamos ainda muito atentos a novas tecnologias na área de storage. Conseguir armazenar de forma eficiente é fundamental para a estabilidade do sistema elétrico e existem muitas tecnologias em fase de teste que nos interessa aprofundar.
Afirmam querer “contribuir para um mundo mais verde, através da descarbonização da economia”. Como se faz a descarbonização da economia?
As alterações climáticas são o desafio comum que todos, em conjunto, temos para enfrentar. Não estamos em linha com os objetivos traçados no acordo de Paris e, segundo o último relatório do IPCC (AR6), o limite estabelecido de aquecimento global de 1,5°C e 2°C será provavelmente ultrapassado durante o século XXI, a menos que nas próximas décadas ocorram reduções profundas nas emissões de CO2 e de outros gases com efeito de estufa.
É urgente descarbonizar, o que envolverá, por um lado, a eletrificação da economia com a adoção de fontes renováveis para a produção dessa eletricidade, e, por outro lado, a utilização de fontes de energia ‘verde’ em todas as áreas em que a eletrificação não é possível, como transporte pesado ou alguns processos industriais, recorrendo à utilização de hidrogénio ou biometano, por exemplo.
Finalmente, será ainda necessário promover a proliferação de sumidouros, já que a concentração de CO2 é de tal forma exagerada que não bastará reduzir as emissões. O que é um facto é que estas necessidades imperiosas constituem enormes oportunidades de negócio, o que potenciará a resolução do problema.
“A sustentabilidade tem de estar no centro de decisão das empresas (…)”
O mercado empresarial português está preparado para as novas realidades relacionadas com a energia e a sustentabilidade?
Não querendo ser injusto para alguns, eu diria que na maior parte dos casos ainda não. Desde logo, devido às falhas de mercado de que falei, nomeadamente o foco no curto prazo e falta de incorporação do risco de longo prazo nas tomadas de decisão.
Quando incorporarmos esses riscos, nomeadamente na taxa de desconto dos projetos de investimento, ou ainda quando as taxas dos empréstimos subirem para projetos não sustentáveis, aí tudo ficará mais claro. Porventura, demasiado tarde e com demasiados custos.
A perceção atempada do que se está a passar é demasiado importante para ser delegada em departamentos de compliance. A sustentabilidade tem de estar no centro de decisão das empresas, já que é imprescindível para a definição do retorno do investimento ou para a sustentação de resultados operacionais.
Que investimentos estão a planear para este ano? Quais as prioridades?
Este ano, para além de consolidarmos a nossa posição na área de Utility Scale, vamos apostar nas áreas de Energy as a Service e Electric Mobility. São duas áreas essenciais para a descarbonização. No primeiro caso, porque é fundamental que a produção descentralizada de eletricidade seja massificada, mesmo sem o investimento por parte dos clientes que pode ficar a nosso cargo. Utilizar o máximo de potencial solar junto dos locais de consumo, com valores de tarifa muito competitivos e com ganhos muito significativos para os nossos clientes, contribui para a eletrificação da economia, mas também para o aumento da competitividade das empresas portuguesas. Mais uma vez, propósito com retorno financeiro.
No caso da mobilidade elétrica, acreditamos que parte da solução para a mobilidade passará pela eletrificação e, como tal, apostaremos numa rede de pontos de carregamento com a intenção de a fazer crescer rapidamente. Seremos coerentes com os nossos valores e consequentes na concretização dos nossos objetivos.
Entrevista completa de Miguel Subtil – Managing Director, que serviu de base ao artigo publicado no Link to Leaders no dia 26 de abril 2023.